sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Fórum internacional debate mídia, poder e democracia

Fórum com cobertura direta da CartaMaior pelo seu blog, um esforço admirável na democracia da mídia.

INSEGURANÇA INFORMATIVA
Observatórios de mídia refletem descrédito da imprensa
Iniciativas de acompanhamento e fiscalização da mídia são resposta da sociedade tanto aos desmandos da imprensa quanto à demanda por uma maior democratização e ética da mídia.
Verena Glass
SALVADOR - Em 11 de março de 2004, a Espanha ficou paralisada pelo terror de um atentado ao trem de Madrid em pleno horário de pico. Dezenas de pessoas morreram e centenas ficaram feridas. Pouco após o ocorrido, o governo do presidente José Maria Aznar divulgou, como resultado de uma apuração supostamente confiável, que o ato terrorista teria sido cometido pelo grupo separatista basco ETA. Como se soube depois, os editores dos principais veículos de comunicação do país receberam telefonemas de Aznar pessoalmente ou de seus ministros, reafirmando a informação.No subterrâneo das comunicações não alinhadas, no entanto, rapidamente outra versão começou a tomar corpo: não foi o ETA, mas sim um grupo islâmico que teria inclusive assumido a autoria do atentado. Esta versão, que acabou se confirmando, custou ao grupo político de Aznar a vitória na eleição presidencial que ocorreu três dias depois. A resposta da sociedade à tentativa de incriminar com mentiras um grupo de esquerda para fins eleitorais foi avassaladora, e venceu o repúdio ao apoio do governo de direita à ação americana no Iraque. Dessa forma, a improvável candidatura do progressista José Luiz Zapatero virou a mesa e levou a presidência, num dos processos mais extraordinários de força da opinião pública da história recente.Mentiras exemplares da imprensa, como as que deram conta da existência de armas de destruição em massa no Iraque e da participação do governo do país nos atentados de 11 de setembro de 2001 nos EUA, e que justificaram o hediondo crime da invasão americana, são extremos de uma realidade que tem levado a sociedade a sofrer do que o jornalista Ignácio Ramonet, diretor do jornal francês Le Monde Diplomatique e do Media Watch International, chama de insegurança informativa.Palestrante do Fórum Internacional Mídia, Poder e Democracia, que ocorre até este dia 14 em Salvador, Ramonet apresentou os exemplos acima para expor um processo de descrédito crescente auto-infligido pela mídia, uma vez que a imprensa e seus profissionais, grandes lutadores da democracia em momentos de repressão e ditadura, passaram a ser eles próprios os grandes violadores desta democracia em nome da mercantilização e "mercenarização" da informação.A sensação de insegurança informativa se aprofundou com um certo abandono da imprensa de seu papel de "quarto poder", o avaliador crítico das disfunções do Estado e suas instancias legislativas, executivas e judiciárias. O interesse é outro, explica Ramonet. "O importante hoje, para a imprensa, é o que o maior número de pessoas quer ver e ouvir. As informações são cada vez mais breves, emotivas e espetaculares. E, cada vez mais, estas informações são gratuitas. Então onde está o negócio? Se trata de vender gente aos anunciantes, e para ter mais gente, a informação tem que ser sedutora", pondera. E neste ponto, a credibilidade do veículo e do trabalho jornalístico sofre sérias avarias.Neste cenário, o surgimento de um número cada vez maior de iniciativas de monitoramento da mídia em todo o mundo, a exemplo do Observatório de Imprensa ou do Observatório de Mídia no Brasil, tem sido um reflexo claro da reação da sociedade perante o descrédito dos veículos de comunicação."Temos agora que buscar uma unidade maior destas iniciativas mundo afora", sugere Ramonet, para que o processo de acompanhamento crítico da mídia se fortaleça como uma espécie de 'quinto poder'. "Estamos sugerindo um encontro mundial, quem sabe no Brasil, ligado ao processo Fórum Social Mundial de 2009, que ocorrerá em Belém, para unificar os observatórios de mídia".